Nesta segunda-feira (7), quando a Lei Maria do Penha
completa 11 anos de existência, o Instituto Maria da Penha lança uma campanha
para chamar atenção sobre os números da violência contra a mulher. Chamada de
“Relógios da violência“, a ação faz uma contagem, minuto a minuto, do número de
mulheres que sofrem violência no país. O objetivo é incentivar as denúncias de
agressão, que podem ser físicas, psicológicas, sexuais, morais e até
patrimoniais.
O usuário que quiser participar pode acessar o site e
compartilhar os dados da campanha nas redes sociais, com a hashtag
#TáNaHoraDeParar. Em celebração à data, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
também está promovendo uma mobilização no Twitter com a hashtag #SouMulherE.
A Lei nº 11.340 leva o nome da farmacêutica cearense Maria
da Penha, atualmente uma das principais ativistas na luta pelo fim da violência
contra a mulher. Ela foi vítima do próprio marido e ficou paraplégica após as
agressões. Para a advogada Isadora Vier, especializada na área de gênero dentro
do direito penal, a lei trouxe avanços importantes.
“Tem sido uma galgada de conquistas importantes, no sentido
de aparelhamento das redes de atendimento, uma compreensão de que o atendimento
tem que ser multidisciplinar, envolver várias instâncias. Nesse caso, a
avaliação é positiva”, avalia.
De acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres
(SPM), a Central de Atendimento à Mulher registrou, no ano passado, 1.133.345
atendimentos. O número foi 51% superior ao de 2015 (749.024). Uma atualização
das estatísticas sobre as agressões no país deve ser feita, ainda esta semana,
pela secretaria. A central pode ser acionada pelo telefone 180.
Para a pesquisadora Simone Henrique, a lei é “um marco
civilizatório”, mas ainda não conseguiu atacar uma das matrizes do problema: o
machismo, que faz com que as agressões sejam naturalizadas. “A opressão é
sistêmica e estrutural nossa sociedade. O que me aflige é que a mudança da lei
aprimora a mudança de costumes, mas não muda a cultura, ela é mais um elemento
da cultura. Outros atores e agentes precisam se envolver mais, em face da
mulher”, diz Simone, que é mestre em
direito pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em estudos sobre a
mulher negra.
O juiz Ben-Hur Viza, um dos coordenadores do Centro
Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania da Mulher em Situação de
Violência Doméstica e Familiar do Distrito Federal, considera que o maior
avanço da Lei da Maria da Penha foi fortalecer a medida protetiva como modo de
garantir a segurança da mulher.
“Temos uma estrutura muito bem montada. Uma medida protetiva
é resolvida em 24 horas. Os juízes [do Tribunal de Justiça do Distrito Federal
e dos Territórios] têm um acordo de cavalheiros de decidir no dia a medida, e
oficiais cumprem o mandado na sequência, com o mesmo prazo. Então, tem sido
muito ágil. A Lei Maria da Penha avançou muito porque, se temos pouco hoje,
antes não tínhamos nada”, considera.
Entretanto, ele aponta que os problemas orçamentários por
vezes dificultam o cumprimento das ações. “A realidade nacional não é só uma
questão do Poder Judiciário, tem uma crise orçamentária que impede a
contratação de mais servidores, afeta a estrutura, e o Judiciário fica
dependendo do Executivo. Não há juizado especializado em todas as comarcas do
país. Já em outras, funcionam muito bem”, aponta Viza.
Para romper o ciclo de violência, a autonomia financeira e
mesmo emocional da mulher são apontadas por especialistas como as principais
portas de saída. “Se não tenho a mínima estrutura para desenvolver toda minha
potencialidade, vou ser mais facilmente um alvo, porque não terei educação, não
vou conseguir procurar um serviço de saúde para me cuidar, não vou enxergar, na
delegacia ou no consultório, um lugar acolhedor para dizer : ‘Eu passei por um
episodio de violência’ ”, exemplifica Simone.
Educação
Além da violência física, mais facilmente reconhecida pela
sociedade, as agressões psicológicas também são um problema a ser enfrentado,
apontam especialistas. Isadora alerta que o conceito abordado na Lei Maria da
Penha corresponde somente a um parâmetro de interpretação do que seria tal
violência, o que muitas vezes pode dificultar a qualificação da agressão
psicológica.
“Nas esferas judiciais, existem tipos penais, para que [as
outras formas de violências] possam sofrer intervenção direta. Já a psicológica
é muito mais ampla. Quando há difamação, ameaça, outras práticas mais sutis,
como o marido deixar de conversar com a companheira, algo que pode ser muito
devastador, ou práticas repetitivas, é difícil provar. E a violência
psicológica é também difícil de ser percebida pela própria mulher”, aponta
Isadora.
Atualmente, a pesquisadora desenvolve um projeto de educação
de gênero na Universidade Estadual de Maringá. Estudantes bolsistas são
qualificadas e já espalharam o conhecimento adquirido sobre a violência contra
a mulher em oficinas com 120 outros jovens, incluindo homens. “A própria lei
diz que é obrigatória essa educação. Sem dúvida, é o caminho mais potente de
todas as ações porque, além de disseminar esse conhecimento, diminui
ocorrências. É um trabalho que requer que todas as instâncias da sociedade sejam
conclamadas”, diz Isadora.
Fonte: Metro Jornal
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